terça-feira, 11 de novembro de 2008

Venda Nova, uma cidade dentro da cidade

Do Jornal Estado de Minas de 9.11.8 (Domingo)
Distrito, que começou a ser povoado em 1711, pertenceu a vários municípios até ser anexado a Belo Horizonte. Tem cerca de 250 mil moradores e enfrenta problemas semelhantes aos das grandes cidades, mas há também muito do que se orgulhar
Paulo Henrique Lobato

Dezembro é mês importante para Venda Nova: o primeiro distrito de Belo Horizonte começou a ser povoado em 1711, quase dois séculos antes da inauguração da capital, em 1897, mas sua história administrativa com a cidade só teve início no último mês de 1948, quando foi aprovada a Lei Estadual 336. O texto determinou que a área, atualmente formada por 31 bairros e 16 vilas, fosse anexada ao município, processo concluído em 1949, pois, até então, havia sido terra de Sabará, de Santa Luzia e de Campanha, hoje Justinópolis, pertencente a Ribeirão das Neves. Prestes a completar 300 anos de fundação e 60 de integração a BH, a região é um distrito com status de cidade, com cerca de 250 mil moradores, distribuídos em 27,6 quilômetros quadrados. A origem do nome remonta aos tropeiros. O documento mais antigo sobre o então vilarejo, segundo a Prefeitura de BH, é uma solicitação de licença para abertura de uma venda, em 1781, décadas depois de a área receber os primeiros habitantes. Alguns se instalaram ali para atender os tropeiros que vinham da Bahia, seguindo o traçado do Rio São Francisco, até chegar às terras banhadas pelo leito do Rio das Velhas. Conta a tradição oral que a venda era bonita, grande e, claro, nova. Daí o batismo, que, por anos, ficou na boca dos viajantes que levavam gado do Norte para o Sul do país: “Vamos parar naquela venda nova”. A história reforça a vocação comercial do distrito. A Regional Venda Nova, da prefeitura, informa que a área conta com nove agências bancárias, 4.206 empresas varejistas, 499 atacadistas, 4.102 prestadoras de serviços, 537 profissionais autônomos e 286 indústrias. Boa parte dos empresários se instalou na Rua Padre Pedro Pinto, antiga Rua Direita, que, na época dos tropeiros, era a Estrada do Carretão. Na verdade, um caminho bem mais estreito que o atual, invadido por dezenas de linhas de ônibus, carros, motos, caminhões e até perueiros.

Hoje, densamente ocupada, com 16 vilas e 31 bairros não muito bem ordenados, prepara-se para comemorar, em 2011, seus 300 anos.


O transporte clandestino e a diversidade comercial mostram que Venda Nova é o espelho da capital, com pontos positivos, como o centro cultural do Bairro Novo Letícia, que atende mais de 1 mil moradores, e negativos, entre eles as pichações, que tiram parte da beleza dos imóveis. As duas faces da mesma moeda fazem parte do dia-a-dia de Nilza Silva de Oliveira Miranda, de 69 anos, que mora no distrito desde 1963. “Venda Nova era pequena e todos se conheciam. Não é mais assim. Cresceu. É uma cidade, né?”, define a aposentada, afilhada de Padre Pedro Pinto, que morreu em 1953. Da janela de casa ela observa o vaivém de veículos na via que homenageia o padrinho. Repara que uma multidão transforma a rua num formigueiro. O casal André Luís Ribeiro, de 24, e Alaíde Rodrigues Feitosa, de 20, passa pela Padre Pedro Pinto diariamente. Grávida de nove meses, a jovem espera o primogênito, cujo nome também começará, como o dela, com a primeira letra do alfabeto: Arthur. “Já está para nascer”, diz a futura mãe, passando a mão pela barriga, enquanto descansa num dos bancos da Aminthas de Barros, uma das 104 praças do Venda Nova.


Outra praça é a Francisco Monteiro Lara, no Centro. O espaço, pequeno, abriga um grande patrimônio da cidade. Trata-se de um cruzeiro, o que reforça a religiosidade de Venda Nova, cujo padroeiro é Santo Antônio. O distrito oferece aos moradores e visitantes os coloridos jardins dos parques Alexander Brant, no Bairro Candelária, e Cenáculo, no bairro homônimo. Outra importante área verde é o clube do Sesc, que chama a atenção de muitas pessoas que moram em bairros da parte alta de Venda Nova, como o Nova Iorque.


QUEIMA DE FOGOS

É de lá que as primas Maria Aparecida Silva, de 36, e Valquíria Francisca da Silva, de 20, têm uma bela vista da capital. “Na virada do ano, muita gente vem para cá ver a queima de fogos na Lagoa da Pampulha. O céu fica lindo”, diz a mais nova. Segundo a Regional, a altitude da região oscila de 751 a 850 metros. Em algumas partes do vetor Norte, chega a 1 mil metros. O raios-X do perfil de Venda Nova reforça que o distrito tem status de cidade. Tão importante que tem até restaurante popular. “A comida é muito boa. Hoje, almocei arroz, feijão, salada, canjiquinha e bife de porco. De sobremesa, banana. Antes, tinha que trazer marmita para o trabalho. Agora, é diferente. Como bem e pago apenas R$ 1”, agradece o jardineiro Paulo Eusébio, de 42, que mora no Bairro Mantiqueira.


Outra ação importante da região é o Centro Cultural do Bairro Novo Letícia, que atende mais de 1 mil pessoas, entre elas o jovem Gabriel Marques, de 12. A instituição oferece oficinas de lazer e cultura à comunidade, além de ampla biblioteca. “Muita coisa mudou na minha vida. O Centro estimula a gente a estudar. Fiz muitas amizades”, elogia o menino.

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